Por Rute Saraiva
domingo, 19 de dezembro de 2010
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal,
senão rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e
uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa amar a água implícita,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal,
senão rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e
uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita.
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
Como Nossos Pais
Canção escrita pelo cantor/compositor brasileiro Belchior, em 1976.
Interpretada por Eles Regina.
O Bruto
O bruto foi uma das figuras mais glosadas pelos caricaturistas do tempo de Renoir. Bruto é o rico que diz e pensa: "Que mal faz se eu pisar estas flores? Fui eu que as paguei!" É o pobre que rouba o papel nos sanitários dos comboios. "Quem vier a seguir que se f...!" O bruto serve-se de uvas arrancando os bagos do cacho sem o tirar da fruteira. O bruto faz barulho enquanto os dormem, fumam enquanto os outros tossem, cospe nas poças de água e seduz uma mulher mesmo sabendo-se portador de doença venérea. O director de teatro que envenena o seu público com pornografia ou com incitamento ao crime é um bruto. Para o meu pai, o especulador que abatia as árvores de um pomar das margens do Sena para construir um imóvel de cimento armado era um bruto, como um bruto é o imbecil que desflora uma rapariguinha crédula. Outro exemplo que impressionava o meu pai era o seguinte: antigamente, nos grandes cafés, o criado deixava a garrafa de aperitivo na mesa do cliente, confiando na parcimónia deste. As hordas de visitantes de Exposição de 1900 não eram exclusivamente constituídas por cavalheiros e os visitantes mal-educados aproveitavam a confiança neles depositada para se servirem até ao cimo das copos, já que o preço era o mesmo. Resultado: agora, o criado serve-nos com parcimónia e leva a garrafa, o que é um insulto. A uma bruteza responde-se com outra, e o mal alastra como uma epidemia!
Jean Renoir , in "Pierre-Auguste Renoir, meu pai"
sábado, 11 de dezembro de 2010
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
Tutankamon
Deixo aqui uma interessante sugestão para quem gosta da história da civilização egípcia. Um sítio disponível na rede, dedicado à descoberta do túmulo de Tutankamon, em 1922, pelo arqueólogo inglês Howard Carter - Tutankhamun: Anatomy of an Excavation. O
Instituto Griffith, de Oxford, disponibilizou o acesso a todos os
interessados, a consulta de tudo o que foi recolhido, ao longo de dez
anos de investigação arqueológica. Nele estão documentados cerca de 5.398 objectos, e ainda fichas, notas e diagramas do egiptólogo inglês, com uma transcrição de modo a ajudar a leitura.
Howard Carter examinando a tumba de Tutankhamun.
Outubro, 1925
Outubro, 1925
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
domingo, 5 de dezembro de 2010
sábado, 4 de dezembro de 2010
Elogio ao amor
Há
coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma
coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue
pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for
incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de
clareza. Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para
dizer. Mas tenho de dizê-lo.
O
que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se
apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém
aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão
de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao
lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido.
Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa
das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje
em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de
antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O
amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se
sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor
transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A
paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor
tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de
se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.
Eu
quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do
amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas,
farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi
namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de
hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de
ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do
"tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos,
bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém
se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a
tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como
um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O
amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha.
Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas
costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da
vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania
contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde
quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada,
abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da
pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O
nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para
nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão
de azar.
O
nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a
tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma
coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma
convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um
princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a
ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é
para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é nossa alma.
É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não
apanha, não larga, não compreende.
O
amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é
bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor
é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais
bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração
apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito
difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos
escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá
quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se
lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber,
amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar
magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz.
Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é
outra. A vida dura a Vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode
durar a vida inteira. E valê-la também.
Miguel Esteves Cardoso
sexta-feira, 3 de dezembro de 2010
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
MAR PORTUGUÊS no Português de Malaca
Mar salgado, quanto do teu sal
Mar salgadu, kai kuantu di bos se sal
Mar salgadu, kai kuantu di bos se sal
São lágrimas de Portugal!
Se largri di Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Treversah kum bos, kuantu mai ja chura
Quantos filhos em vão rezaram!
Treversah kum bos, kuantu mai ja chura
Quantos filhos em vão rezaram!
Kuantu fila filu ja reza seng per nada
Quantas noivas ficaram por casar
Kuantu noiba fikah nungka kazah
Para que fosses nosso, ó mar!
O mar fika nus se mar!
Quantas noivas ficaram por casar
Kuantu noiba fikah nungka kazah
Para que fosses nosso, ó mar!
O mar fika nus se mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Teng se balor? Tudu teng balor
Se a alma não é pequena.
Si alma ngka keninu
Teng se balor? Tudu teng balor
Se a alma não é pequena.
Si alma ngka keninu
Quem quer passar além do Bojador
Keng kerey passa rentu ne Bojador
Tem que passar além da dor.
Mesti tokar passa kum tantu sufra.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Dios ja dah mar eli se perigu kum se fundezu.
Mas nele é que espelhou o céu
Mas ne eli te speladu ungwa seo.
Fernando Pessoa
Keng kerey passa rentu ne Bojador
Tem que passar além da dor.
Mesti tokar passa kum tantu sufra.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Dios ja dah mar eli se perigu kum se fundezu.
Mas nele é que espelhou o céu
Mas ne eli te speladu ungwa seo.
Fernando Pessoa
Poema de Fernando Pessoa traduzido para Papia
Português de Malaca.
Publicado no blogue : http://malaca-portugal.blogspot.com/ no arquivo de 31. 10. 2010
s/título, 1999
© Rute Saraiva
s/título, 1999
© Rute Saraiva
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
Nothing Gold Can Stay
Nature's first green is gold,
Her hardest hue to hold.
Her early leaf's a flower;
But only so an hour.
Then leaf subsides to leaf.
So Eden sank to grief,
So dawn goes down to day.
Nothing gold can stay.
Robert Frost
domingo, 7 de novembro de 2010
A Genialidade de Alexander Calder
Performance de Calder: Circus. Registada num filme realizado em 1955, por Jean Painleve.
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
Propaganda da Revolução Cultural Chinesa II (1966 - 1976)
As 12 pinturas reproduzidas aqui, mostram o estilo único de trabalho
feito a escova característico da pintura chinesa, com a sua longa tradição.
Elas foram seleccionadas a partir da Exposição Nacional de Belas Artes de 1973.
Elas foram seleccionadas a partir da Exposição Nacional de Belas Artes de 1973.
Postais (clique aqui para vê-los)
Imprensa Línguas Estrangeiras
Pequim 1974
Impresso na República Popular da China
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
Propaganda da Revolução Cultural Chinesa I (1966 - 1976)
.
.
Publicado por Shanghai People's Publishing House, Shanghai, China
Distribuido por Guozi Shudion (China Publications Centre), Pequim, China
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Elvis Costello and Chet Baker - You don't know what love is
You don't know what love is
Until you've learned the meaning of the blues
Until you've loved a love you've had to lose
You don't know what love is
You don't know how lips hurt
Until you've kissed and had to pay the cost
Until you've flipped your heart and you have lost
You don't know what love is
Do you know how a lost heart feels
The thought of reminiscing
And lips that taste of tears
Lose their taste for kissing
You don't know how hearts burn
For love that cannot live yet never dies
Until you've faced each dawn with sleepless eyes
You don't know what love is
Do you know how a lost heart feels
The thought of reminiscing
And lips that taste of tears
Lose their taste for kissing
You don't know how hearts burn
For love that cannot live yet never dies
Until you've faced each dawn with burning eyes
You don't know what love is
What love is
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Gustav Klimt - Moving Water (1898)
O mar – sempre que toco
um corpo é o mar que sinto
onda a onda
contra a palma da mão.
Vésper está agora
tão próxima que já não posso
perder-me naquela infatigável
ondulação.
um corpo é o mar que sinto
onda a onda
contra a palma da mão.
Vésper está agora
tão próxima que já não posso
perder-me naquela infatigável
ondulação.
O Corpo - (Eugénio de Andrade)
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